segunda-feira, 25 de agosto de 2014

Introdução de alimentos para bebês

Digite no Google "introdução de alimentos". Você terá como resposta, em praticamente todos os sites, que a partir do sexto mês o leite materno não é mais suficiente e o bebê precisa de aporte nutricional extra. Será mesmo?

Na consulta do sexto mês da Luisa lá nos EUA, a pediatra nos disse que, a partir daquele momento, ela poderia começar a comer. Porém, ao contrário do que ouvíamos por aí, ela nos informou que o objetivo da alimentação não era por necessidade nutricional, e sim lúdico. Para conhecer sabores e descobrir a comida. A orientação foi para, após a mamada, deixarmos a comida disponível para ela comer apenas se quisesse.

No começo achei estranho, pois eu achava que a Luisa precisava comer. Com muitas dúvidas, pesquisei na internet, pesquisei artigos científicos e conversei com algumas colegas que amamentaram exclusivamente até 10 meses ou mais. Confesso que fiquei feliz em saber que minha pediatra estava certa, pois eu ainda não estava preparada para deixar de exclusivamente amamentar a minha filha.

Logo a Luisa passou a demonstrar interesse pelas nossas comidas, faltando pouco para completar sete meses. Então optamos por oferecer a ela sabores diferentes. Banana, maçã, mamão, cenoura, dentre outras coisas, passaram a fazer parte da brincadeira. Literalmente. Ela amassava, jogava no chão, amassava mais, batia, apertava, passava no cabelo, olhava, mas nada de colocar na boca. Só sentiu o gosto pois dei a ela alguns pedacinhos, mas ela cuspia e logo passou a empurrar minha mão e virar a cabeça. Foram quase três semanas assim, mas o recado estava dado: ela não estava pronta para comer. Muito provavelmente, estava apenas curiosa com o que via e não necessariamente querendo se alimentar.


Foi aí que, lendo mais artigos, descobri que um dos sinais de que o bebê está pronto para comer, que o seu sistema digestivo está maduro o suficiente, é o nascimento dos dentinhos. Esse foi um dos motivos pelo qual eu desisti, pois naquela época os dentes dela não estavam nem ameaçando nascer.


Foi apenas recentemente, com quase nove meses, que os primeiros dentinhos da Luli apareceram. Assim, depois de mais dois meses de amamentação exclusiva, voltamos a oferecer alimentos, mas ela está indo bem devagar. Estou oferecendo alimentação em pedaços. Ela come com a mão apenas alguns pedaços de legumes, frango e em seguida, na mesma "refeição", pedaços de frutas de sobremesa. Nada de suquinhos, ela come a laranja com bagaços e tudo, que é muito mais nutritivo. 




Apesar de meu pediatra daqui de São Paulo concordar que o leite é suficiente e que não comer agora não influenciará em nada seu hábito alimentar no futuro, ele quer que ela coma de qualquer jeito. Na nossa última consulta, ele sugeriu que eu não desse de mamar e a deixasse chorando de fome até comer. Eu perguntei o porquê e ele me respondeu que ela tem que aprender a me obedecer. 


Aprender quem manda na casa? Por que que eu vou travar uma batalha com ela na mesa, para ver qual das duas é mais teimosa, se o meu leite é muito mais completo e nutritivo que qualquer outro alimento, por mais saudável que seja?

Para o bebê, colocar um alimento na boca não significa apenas saciar a fome. Significa a compreensão profunda e total de que ele e a mãe não são uma só pessoa, de que existe um mundo além do peito materno, e que esse mundo também é capaz de alimentá-lo. Exige amadurecimento cognitivo e emocional. Portanto, a introdução alimentar deve ser feita da maneira mais respeitosa e carinhosa possível. 

E o nosso dia-a-dia segue assim: eu vou comendo junto com a Luisa. Os poucos pedacinhos que ela come é porque me vê comendo e me imita. Não sigo a receitinha carimbada do consultório médico que orienta uma refeição salgada diferente da hora da frutinha. Não ofereço alimento antes da mamada. Não forço e nunca vou deixá-la chorando para que coma. Não tenho pressa e não vou abafar minha intuição para satisfazer um padrão que na verdade não existe: nem todos os bebês estão preparados para comer com 6 meses.


A alimentação é complementar e não o leite.

Seguem abaixo trechos do livro do Dr. Carlos Gonzales, pediatra famoso mundialmente pelos seus livros de atenção e cuidados humanizados com o bebê.


"Oferecer significa que, se ele quiser comer, o bebê come, mas se não quiser, não come. Muitas crianças recusam tudo menos o seio até 8 ou 10 meses, muitas vezes mais."

"Alimentos sólidos são oferecidos depois da amamentação, não antes, e certamente não em substituição à amamentação. Somente assim você tem certeza de que seu bebê tomará o leite de que precisa. Acredita-se que entre 6-12 meses o bebê precise de cerca de 500 ml de leite por dia. Claro que isso é uma média, muitos tomam mais e outro ficam bem com menos. Uma criança que toma mamadeira pode facilmente ficar bem com 2 mamadas de 250 ml ao dia. Não é razoável, porém, esperar que um bebê amamentado tome 250 ml a cada 12 horas: os seios da mãe ficariam desconfortavelmente cheios. Faz mais sentido para bebês amamentados tomar 100 ml cinco vezes por dia ou 70 ml sete vezes por dia. Certamente você não sabe (ou não sabia antes de iniciar os sólidos) quanto leite o seu bebê mama: mas se ele é amamentado antes da oferta de sólidos, você fica tranquila sabendo que ele mama o que precisa.


"E se ele não quer comer comida de bebê? Não se preocupe, isso é totalmente normal. Não tente forçá-los. Você talvez tenha sido aconselhada a oferecer sólidos antes do peito, asim ele estará com fome suficiente para comer. Isso não faz o menor sentido, uma vez que o leite materno nutre muito mais que qualquer outro alimento. É por esta razão que usamos o termo "alimentação complementar". Sólidos não são nada mais que um complemento ao leite materno. Se seu bebê mama e depois rejeita frutas, nada acontece: mas se ele aceita fruta e depois não mama, ele sai perdendo. Mais fruta e menos leite é uma receita para perda de peso.

" O mesmo vale para leite artificial. Lembre-se que se você não está amamentando, você precisa dar ao bebê meio litro de leite diariamente até que ele tenha 1 ano de idade"

"A razão principal de oferecer outros alimentos ao bebê com 6 meses (e não depois) é que alguns bebês precisam de ferro extra. Portanto, seria lógico que comidas ricas em ferro fossem introduzidas primeiro. Por uma lado, há carnes com alto teor de ferro orgânico altamente biodisponível. Por outro, há legumes, leguminosas e cereais que contêm ferro inorgânico, mais difícil de ser absorvido a menos que esteja combinado com vitamina C. É por isso que muitos adultos comem a salada primeiro (rica em vitamina C), depois os grãos e legumes, e a sobremesa por último. O que é comumente feito com bebês na Espanha não é uma idéia muito boa, oferecendo a eles somente grãos numa refeição, legumes na outra e fruta na próxima refeição. Quando seu bebê ingere muitos alimentos, é uma boa idéia combiná-los, oferecendo-os numa mesma refeição (não batendo todos juntos no liquidificador, fazendo menus monocromáticos)"

Dr. Carlos Gonzáles coloca também que muitos pediatras orientam a introdução alimentar precocemente, no quarto ou quinto mês, e que alguns bebês podem sim estar preparados antes do sexto mês. Porém, muitos bebês não estão e não tem maturidade motora e cognitiva suficiente para negar nesta idade. Esses bebês crescem acostumados com a papinha e o suquinho porque lhes impuseram, mas uma das maneiras de saber se o bebê está pronto para sólidos é esperar que ele demostre interesse por elas, pegue com suas próprias mãos e se alimente.

Sobre deficiência (ou não) de ferro

A Organização Mundial da Saúde orienta introduzir alimentos para os bebês a partir do sexto mês, já que a partir dessa data, a reserva de ferro do bebê, armazenada durante a gravidez, começa a chegar ao fim, e a única deficiência do leite materno é a de ferro. 

Porém, nem todos os bebês precisam de ferro extra. Além disso, existem algumas maneiras de aumentar o estoque de ferro do recém-nascido. Uma delas é praticar uma alimentação saudável durante toda a gestação. Outra maneira de incrementar o estoque de ferro é realizar clampeamento tardio do cordão umbilical. Hoje sabe-se que cortar o cordão umbilical tardiamente após o nascimento, ou seja, esperar por alguns minutos até que ele pare de pulsar espontaneamente para só então cortá-lo, aumenta o aporte sanguíneo para o bebê em aproximadamente 100 ml, o que vai garantir reserva de ferro para o bebê até os seus 12 primeiros meses de vida.

Tive uma alimentação saudável e balanceada durante toda a gestação. Além disso, a Luisa nasceu de parto normal e por isso não teve seu cordão umbilical cortado às pressas.  Faço acompanhamento regular no pediatra e sabemos que ela não tem anemia. Por isso não me preocupo que ela coma, no total, apenas dois ou três pedacinhos do que ofereço. Nunca chegou a fazer uma refeição inteira e come apenas o quanto lhe interessa. Tem dias que ela não aceita comer nada! Nada! Mesmo assim, ela ganha peso, cresce e se desenvolve psico-motoramente normalmente todo mês. Assim eu sigo respeitando o seu ritmo, e agora estamos completando nove meses e meio de amamentação praticamente exclusiva.

Dicas de leitura

Livro "Meu filho não come", de Carlos Gonzáles. Neste livro ele aconselha e explica: Não obrigue seu filho a comer. Não o obrigue jamais, por nenhum método, sob nenhuma circunstância, por nenhum motivo.

Livro "Maternidade e o encontro com a própria sombra" , de Laura Gutman. Leia o capítulo 3, Lactação e algumas reflexões sobre o desmame.

http://www.babyledweaning.com/ - Site muito legal mostrando que sim, bebês são capazes de comer pedaços com as próprias mãos.

Curso de Introdução Alimentar com abordagem humanizada, baseado nos princípios do Dr. Carlos Conzáles e Laura Gutman: 
http://vilamamifera.com/alimentoecomportamento/category/workshop/


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